25 de fev. de 2010

Bebidas alcoólicas: responsabilidade dos supermercadistas e vantagens para toda a sociedade (por uma seção especial para produtos com venda restrita)


Prezados(as) Senhores(as),

Estou lhes enviando abaixo um pequeno texto que apresenta, de modo singelo, a proposta para que os estabelecimentos comerciais, em especial supermercados e similares, tenham uma sessão especial para as bebidas alcoólicas. É o esboço de um manifesto.

Sinceramente, confio numa boa acolhida da idéia, porque se trata de uma ação positiva para todos – comerciantes, consumidores e sociedade em geral.

Somos ainda um pequeno grupo a debater o assunto e a fazer contatos, mas aos poucos estamos estruturando uma mobilização saudável de reflexão e ação concreta na educação do consumo e responsabilização coletiva por mazelas sociais.

É o caso do alcoolismo e tantos outros problemas ligados ao consumo indevidos do álcool, mas que pode, com certeza, ser minimizado por ações relativamente simples, como esta que estamos apresentando – sem cairmos em “radicalismos” contrários ao desfrute de bebidas alcoólicas.

Em meu nome e dos parceiros desta modesta mobilização, agradeço a atenção.

Fico à disposição.

Iuri Azeredo,

iuriaz@hotmail.com,

Santa Cruz do Sul – RS.

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Bebidas alcoólicas: responsabilidade dos supermercadistas e vantagens para toda a sociedade (por uma seção especial para produtos com venda restrita)

A venda de bebidas alcoólicas em supermercados e outros estabelecimentos deveria seguir uma normatização ou, então, uma auto-normatização, além da proibição da venda a pessoas menores de 18 anos, conforme estabelece a legislação brasileira.

A proibição, por si só, é um indicativo de que estamos diante de um produto de uso restrito e potencialmente perigoso ao consumidor. Já é consenso que o álcool pode levar a dependência física e psicológica, e está associado a inúmeras doenças, agressões e acidentes, incluindo os de trânsito. Portanto, não deveria haver nenhuma indução ao consumo ou qualquer situação que indique se tratar de uma “mercadoria qualquer”.

Mas quando as bebidas alcoólicas fazem parte da continuidade de gôndolas onde há refrigerantes, águas mineral, sucos, bebidas isotônicas e mesmo alimentos, estamos a indicar – mesmo que sem a intenção deliberada – uma falsa “inofensividade”. Tratam-se de substâncias que contém quantidades de álcool suficientes para embriagar, ou seja, intoxicar uma pessoa de forma temerária, imprevisível.

Diante disso, não seria prudente e, mais que tudo, educativo, estabelecer-se uma separação maior das bebidas alcoólicas das demais mercadorias nos supermercados e congêneres?

Uma sessão em separado, mas dentro do estabelecimento, com porta específica de entrada, podendo manter uma clara visibilidade através de divisórias com "janelões" translúcidos ou totalmente transparentes.

Nesta sessão, internamente, além de todas as indicações normais das demais gôndolas, também poderiam estar dispostos objetos de merchandising das diversas marcas de cervejas, vinhos, água ardentes, whiskys, conhaques, licores etc. - junto com abridores de garrafa, baldes, pegadores de gelo, equipamentos complementares para o consumo, que poderiam estar ali também, sem necessidade de procurar-se em outras prateleiras. E, se se quisesse ampliar ainda mais os meios de prevenção, poderiam ser dispostos avisos de advertência e outros materiais informativos sobre o uso indevido e consequencias danosas à saúde e bem-estar do consumidor e da sociedade.

Pelo ue observamos, os cigarros e outros produtos assemelhados já têm espaços internos em separado dentro de alguns estabelecimentos – “tabacarias” internas. A separação e o cuidado se justificam como uma ação restritiva e educativa ao mesmo tempo, dentro de uma postura corporativa de comércio responsável e marketing engajado, socialmente correto, trazendo, ao final, vantagens diretas ao sistema mercadológico.

Passa-se a mensagem de cuidado e, ao mesmo tempo, oferece-se um espaço mais exclusivo e até confortável aos adultos que têm condições de arcar com a responsabilidade do consumo de bebidas alcoólicas.

16 de fev. de 2010

Lobisomens e chupa-cabras...

*Não é porque está estreando o filme O Lobisomem, com o ator Benicio Del Toro, que fiz este comentário. (Ou é? Não importa.) Mais porque li a última parte (antes da conclusão) do livro citado abaixo, ou seja, o capítulo VI: "As diabólicas criaturas da noite: vampiros, lobisomens e outros abantesmas". Como já falei, trata-se de um estudo histórico-acadêmico sobre a imaginação geradora de “monstros”, feita pela historiadora, professora da USP, Mary Del Priore. (E olha aí mais uma coincidência: “Del” Toro e “Del” Priory... O filme confirma que o lobisomem, como outras fabulações, permanecem vivas e rendendo histórias há séculos e séculos e séculos...)

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No romance Fogo Morto, considerado a obra-prima do escritor José Lins do Rego, há um personagem, o mestre celeiro José Amaro, que ganha fama de ser lobisomem, porque, foi visto algumas vezes “suspeitamente” vagando nas proximidades de sua casa à noite – quando, na verdade, apenas buscava se refrescar e espairecer após um dia estafante. Mas a fama espalhou-se e o homem – agora tornado lobisomem – começou a por medo até em sua mulher.

A história ficcional de Lins do Rego, mas nutrida das suas vivências infantis e juvenis no nordeste brasileiro, interiores do estado da Paraíba das primeiras décadas do século 20, na zona de engenhos de cana-de-açúcar, com seus cangaceiros e devoções religiosas, registra, entre outros elementos socioculturais, a permanência viva de crendices de origem européias de séculos passados (500 anos, talvez).

Mary Del Priore, no seu já citado “Esquecidos por Deus: Monstros no mundo Europeu e Ibero-Americano”, diz que, no Concílio Ecumênico de 1414, os lobisomens ganharam o reconhecimento oficial até mesmo da Igreja Católica, em mais uma demonstração de que instituições tidas como fidedignas atestam como verdades o que não passa invento de lenda – gênero literário, de transmissão escrita ou oral (seja formal ou informal), que, acho eu, não devem ser desconsiderados em seus potenciais reveladores de conteúdos mais profundos da psique e das sociedades humanas, quando não de verdades por traz de cortinas de fumaça...

O “reconhecimento” de uma organização como a igreja cristã romana fez com que os casos de “licantropia” – transformação de um homem num híbrido com lobo – subissem vertiginosamente. “Entre 1520 e os meados do século XVII verificaram-se 30 mil casos no continente europeu.” [...] Segundo a concepção corrente, os lobisomens, após sua morte, tornavam-se “famintos mortos-vivos a sugar impiedosamente o sangue de suas vítimas”, anota a historiadora Del Priore.

Novamente me remeti aos relatos de contatos “ufológicos”... Não há aí, mais uma vez, paralelos e continuidades entre os lobisomens do século 13 e o do livro Fogo Morto com os relatos “pavorosos” envolvendo chupa-cabras e outros “monstrengos” tidos como “extraterrestres”??? Sangue, aparições noturnas, marcas e... busca frustrada de provas. Mas, mesmo assim, as narrações continuam e se renovam, “enfeitiçando” a nós, sedentos do miraculoso e do terrificante...

Não deve ser a toa que hoje o chupa-cabras coloca-se como mais um personagem do folclore popular brasileiro (e em vários outros países), junto com o curupira, o saci-pererê, a mula-sem-cabeça etc. E, de novo, há aí o “dedo” de muito “ufólogo” a contribuir para a expansão de um “folclorismo ufológico” em lugar do estudo metódico...

12 de fev. de 2010

Geoglifos e o Realismo Fantástico no "Fantástico"...


Sobre a reportagem no programa Fantástico (Rede Globo) de domingo passado, 07/02/2010, vai também meus comentários feitos em outra lista:

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Vou ampliar um pouquinho o mesmo comentário anterior, começando por tentar grafar a palavra “geoglifos” corretamente (escrevi “geóglifos”)...

De fato, muuuuuito interessante! Geoglifos que estavam "escondidos" em meio à mata amazônica brasileira (extremo-oeste, próximo ao Acre) datam de pelo menos o século XIII (e eu desconfio que são bem mais antigos).

“Isso aqui foi gente que fez. É trabalho de engenheiro”, diz o proprietário de terras, o Sr. Jacob Queiroz, do alto dos seus 93 anos.

Mas engenheiros que geraram este conhecimento de que forma? Ou, então, de onde eles vieram? Como detinham essa tecnologia? Onde foram parar?

Questões em aberto...

São valas enormes: retângulos, círculos, octógonos e outras formas muito bem delineadas. E até poucos anos, completamente tapadas pela densa floresta tropical, hoje, infelizmente, rareando em vários pontos.

Ao menos permitiu a visualização dessas misteriosas obras. Dizem que foram feitas num período de seca intensa, quando a vegetação desapareceu... Deve ter durado muito tal seca. Ou o arvoredo foi desbastado pelos “engenheiros”? Ou os “desenhos” foram feitos num período ainda mais longínquo, quando a mata nem estava formada?

Pois é...

Também me chamou a atenção a pressa dos jornalistas em descartar qualquer hipótese que remeta à ufologia – e de uma maneira grosseira, chamando os ufólogos, mesmo de forma indireta, de "delirantes".

O repórter diz o seguinte:

“Também não faltam suposições delirantes. Exemplo: os geoglifos seriam marcas deixadas por extraterrestres. O mesmo já foi dito sobre as linhas de Nazca, no Peru – desenhos gigantescos no deserto, com formas de animais. Pura fantasia.”

Por que “fantasia”, delírio? Há alguma explicação cabal já dada e aceita pela comunidade científica “tradicional”? A própria reportagem menciona que estamos longe de alguma resposta com maior certeza ou consistência.

Tal “prevenção anti-ufológica” imediata me parece tão estúpida quanto o já se sair afirmando que “é sem dúvida coisa de ETs”. Assim, a matéria demonstra e espalha preconceitos em relação aos estudos de ufólogos e ao interesse genuíno de todos os ufologistas.

Claro que há aí uma culpa “nossa”, dos auto-denominados ufólogos, quando dão guarida não a uma ciência aberta, mas a cultos, crendices e coisas assemelhadas...

Para mim, dentro da ufologia, os geoglifos amazônicos são muito mais importantes – do que, por exemplo, crop circles – para lançarmos hipóteses de criações ligadas a outras inteligências, a outras civilizações, quem sabe, até, extraterrestres...

Digo isso um pouco influenciado pelas leituras esparsas dos últimos dias: “O Homem Eterno”, de Louis Pauwels e Jaques Bergier [na fotinho acima] (autores do bem mais famoso “O Despertar dos Mágicos”) e Manuscritos do Mar Morto, de Edmund Wilson (também do bem mais afamado “Rumo a Estação Finlândia”). Duas obras que demonstram grande erudição, passada em linguagem acessível e com ponderações “para além do comum”, mas não-sectária, sem proselitismos ou anunciações proféticas. (Caminhos para desvelamentos, e não mistificações que nos empurram a um atoleiro religioso sem saída.)

***Pauwels e Bergier, de “O Despertar dos Mágicos”, estão arrolados entre os cunhadores (se não são os primevos) da expressão "realismo fantástico". Parece que há uma confusão entre este termo - "realismo fantástico" -, que quer exprimir um maravilhamento com informações que são indicadoras de surpreendentes e empolgantes hipóteses sobre o ser humano, a humanidade e o cosmos, e o termo "realismo mágico", para designar a literatura de caras (geniais também!) como o colombiano Gabriel García Márquez, que produzem contos e romances onde elementos "irreais" entram em histórias verossímeis, caso de "Cem Anos de Solidão".

Serão os ETs de hoje a versão dos monstros do século XVI?


*Mais comentários que elaborei para o debate com meus amigos ligados em ufologia e assuntos correlatos...


Mesmo que isso não seja algo que inviabilize estudos sérios no campo da ufologia – e, pelo contrário, signifique uma interessante linha de investigação para ufólogos –, o meio ufologista está repleto de fabulações. Os relatos extraordinários abundam e, na verdade, acabam por ser uma das características fundamentais daquela que pretende ser a “ciência dos ufos”.

Encontrei subsídios muito úteis para pensar a questão na abordagem feita pela historiadora brasileira Mary Del Priore, professora na Universidade de São Paulo, em seu livro Esquecidos por Deus: monstros do mundo europeu e ibero-americano: uma história dos monstros de Velho e do Novo Mundo (séculos século XVI -XVIII), publicado pela Companhia das Letras em 2000.

Ela diz que, ao vasculhar a produção historiográfica de 200 anos sobre o tema, conseguiu “Resgatar do fundo cultural europeu do século XVI ao XVIII, algumas estruturas mentais por meio das quais se concebiam os monstros e sua diferença.” Del Priore assinala que “‘O possível não se distinguia do impossível’. Os cronistas e viajantes afirmavam, mão sobre o coração, ser verdade o que diziam. Em nome de sua experiência pessoal? Raramente. Com freqüência, em nome da experiência de outrem, de alguém digno de fé, de quem se ouvira falar uma história ‘de verdade’ sobre monstros e monstrengos.”

Tantos relatos resultaram em um consenso geral e sólido, que só foi solapado pela afirmação e investigação “fundada na observação e na experiência”, o que configurou (e configura) a metodologia científica clássica, não mais “confiando” em narrações de “arrepiar o cabelo” – tão prazerosas, tão anunciadoras do empolgante “fora do comum”, mas carentes de sustentação além do “juro que vi” ou “me disseram que enxergaram com os próprios olhos” etc.


Ainda na introdução do seu livro, a historiadora anuncia, quase poeticamente: “Passeio por um universo insólito e ao mesmo tempo cotidiano, passeio pelas ‘marcas de nossos medos’, essa história dos monstros se esforça por penetrar e descobrir no espírito do passado o porquê do imaginário ser tão importante, tão digno de interesse e de poder quanto o visível.” E esta aí, também, um aspecto do respeito que devemos ter em relação aos relatos “ufológicos”, que todos os dias escutamos novos.


IMAGENS – No bestiário, livro com relações de monstros e afins, de Marcotelius, abade e filho de "Felipe, o Bom", príncipe francês nascido em 1396, havia a descrição, com ilustração, de um ser que tem conformações que se assemelham a de gravuras de extraterrestres contemporâneos. Trata-se do "cardeal do mar" (veja acima a reprodução da ilustração) que Del Priory descreve como "imenso peixe dotado de cabeça humana coroada por uma mitra que, segundo uma história relatada por Petrorius, teria aparecido em 1433 no litoral da Polônia. Depois de ter entretido bispos locais, com os quais se comunicara por gestos, abençoou a todos, desaparecendo a seguir num sonoro e elegante mergulho."

Ufologistas poderiam dizer que "está aí mais uma confirmação da existência de seres extraterrestre desde séculos passados". Mas outra argumentação poderá argumentar que os ETs são uma continuidade do atávico motor humano a fabricar suas fabulações, imprimindo nelas seus temores, expectativas, referências culturais e a vontade de emocionar-se com o transcendental, o não-ordinário, o incomum.

Eis o que me parece indicar o texto da professora da USP: Manter-se atento, não descartando, mas também não endossando imediatamente os relatos alheios – ou, mesmo, as nossas próprias visões!

FINALIZANDO – No capítulo de conclusão, a autora lança uma síntese, que também pode servir para as “histórias de ETs”, nos remetendo ainda a mais estudos: “Há nessa trajetória uma quase universalidade de imaginação sobre os monstros em todas as sociedades, do passado e do presente. O que leva a pensar que eles [os monstros ou ETs] têm, aí, um papel importante; os homens, todos eles, obrigam-se a construir mentalmente algo que lhes dê medo. E o medo pode ter suas fontes na religião, na ciência ou na política.”

Iuri J. Azeredo


Algumas outras citações que anotei do livro da Del Priory:

“O domínio do imaginário é constituído pelo conjunto de representações que transbordam do limite imposto pelas constatações da experiência e do encadeamento dedutivo que estas autorizam.”

“[Aquilo que é comum nos humanos:] a curiosidade de longínquos horizontes no espaço e no tempo, terras e mares nunca dantes vistos, angústia inspirada pelo desconhecimento do futuro, em seres extraordinários, atenção aos sonhos.”

“O imaginário [...] servia como contrapeso à regularidade e à banalidade do cotidiano.”



***O texto postado na lista do MGU gerou comentário. Aproveitei para reafirmar o meu ponto de vista. Colo abaixo esta minha “réplica” – com mínimas modificações:

Enviada: terça-feira, 2 de fevereiro de 2010
Para: MGU


Olá, colega!

Agradeço a tua atenção.

Falamos, sim, no Conexão Ufo (programa na Rádio Comunitária de Santa Cruz do Sul) de duas semanas atrás (janeiro 2009), sobre o assunto. Não estava na "pauta", mas surgiu entre as clipagens que eu costumo trazer ao programa, que muitas vezes "rende" um bom debate ou bate-papo.

No texto que rascunhei e passei à lista, tento ligar uma perspectiva sobre "monstros" do século XVI-XVIII, construída pela historiadora Mary Del Priore, para analisarmos os relatos de ETs. Acredito que pode haver, em comum, uma série de componentes sócio-culturais e psicológicos envolvidos.

Acho, sinceramente, que a "vontade de acreditar" (ou o "I Want to believe", subtítulo mui explicativo do último filme Arquivo X) impulsiona ou "contamina" muitos de nós, e aí, não raro, acabamos endossando narrações que não passam de fantasias ou crendices em novas roupagens (prateadas ou verdes... hehe!). Nem por isso, devem ser desrespeitadas, desconsideradas, mas, entretanto, vistas com cautela e também sob um olhar, digamos assim, sociológico ou psicossocial – e sem, muito menos, em princípio, desmerecer as pessoas que trazem tais histórias.

Fora isso, há sempre alguém que gosta de chamar a atenção e então "inventa" algum caso "fantástico". Olha o acontecido, fora da ufologia, com aquela mulher que disse ter vivido um drama durante o “11 de setembro”, perdendo o noivo e blablablá lá nas torres! Também comentamos esse “episódio” no programa, fazendo um "link" com narrações completamente ficcionais e, não raro – o que é pior ainda -, flagrantemente inverídicas, pra não dizer mentirosas, com fins mais ou menos escusos, levando gente respeitável a cair no ridículo...

Aquele abraço!

Iuri



***Ainda envolvendo o debate sobre “monstros & ETs”, segue-se outra mensagem...

Em 5 de fevereiro de 2010, Iuri Azeredo escreveu:


Queridos colegas,

Sobre esses avisos envolvendo Ashtar Sheran...

Pois é... Mandei pra vocês dias atrás um rascunho de um comentário meu com o título “Serão os ETs de hoje a versão dos monstros do século XVI???”. E toda esta preparação para um iminente contato dramático para a salvação do planeta e da humanidade decadente me parece entrar nas fabulações similares às referidas e estudadas pela historiadora Mary Del Priore... Além do “apocalipsismo”, que nos acomete constantemente desde não sei quando, sendo adiado sempre e sempre, mas mantendo o seu vigor, vide as previsões para 2012.

Também está aí, nesses informes e recomendações pomposas, marciais, militarescas até (“comando...", "confederação de mundos...", "tropas dos quadrantes...", "Comandante em Chefe..." etc.), um aspecto messiânico conformador (ou deformador?) da ufologia, que lhe tira, de uma maneira radical, absoluta, do campo científico – mesmo quando falamos de física quântica ou da biologia dos campos morfogenéticos, entre outras linhas pautadas em paradigmas mais abertos, digamos assim. Estamos no campo da religiosidade, da estruturação de seitas “ufologistas” – que, em si, como me referi sobre narrações sobre ETs, merecem toda a atenção do ufólogo, mas não como um engajado ou “crente”. Acho que a postura deveria ser de um estudioso criterioso, que mantém um distanciamento básico, que permita uma abordagem/análise com menos “vícios”.

Abraços!

*Vendo uma ilustração de Ashtar Sheran, comentei com o Rafa que a figura me lembrava o David Bowie em sua melhor forma. Um humano “modelo de beleza”, loiro, forte, alto, olhar inteligente e compassivo, também similar a algumas representações de Jesus – outra referência que se cruza neste “culto ashtariano” e reforça ainda mais os elementos de religiosidade messiânica do caso.

**Ademais, falando em pop, a mencionada pomposidade em designações grandiloquentes como "Comando Ashtar", "Conferderação de Mundos Livres" etc., aludem direto a sagas cinematográficas como Guerra nas Estrelas. O imaginário nesta "cruzada new age espacial" parece não ter nada de muito original...



***Última mensagem envolvendo o assunto:

Enviada: domingo, 7 de fevereiro de 2010
Para: MGU


Prezados colegas,

Agradeço a atenção e deferência dos amigos.

Sim, podem ter certeza de que é com respeito e sincero interesse que me move a debater e externar minhas opiniões sobre temas como Ashtar Sheran e correlatos. Mas não consigo evitar de também tratar com uma certa zombaria, derivada do meu lado cético e pouco afeito a tantas evidências de dubiedades e fraqueza de sustentação –, além da boa vontade ou fé no que é dito.

Aliás, agradeço a vinda da mensagem, porque me provocou a busca de mais informações sobre algo que conhecia alguns poucos fragmentos. Nem suspeitava, por exemplo, que toda esta mobilização no Brasil, que tem a figura de Asthar como centro, desencadeou-se na Bahia, através de um médium Paulo Fernandes, que diz ter estabelecido contato com o “Comandante das Frotas Intergaláticas” e escreveu um relato - “O jovem que se encontrava com extraterrestres” -, fundando, em 1973, o “Ceeas”, Centro de Estudos Exobiológicos Asthar Sheran.

Também não sabia que, antes disso (22 anos), em 1947, houve, na Califórnia, EUA, também a partir de acontecimentos semelhantes (ou semelhantes foram os que aconteceram posteriormente no Brasil...), o surgimento de toda uma organização baseada em supostas mensagens de Asthar, na ocasião intermediadas por um piloto de avião, Van Tassel, e que também fundou um movimento a partir de “orientações” de Asthar.

Aqui e lá, se sucederam “mensageiros” do “comandante em chefe”. (Repito: “ele” vem em paz, mas suas denominações estão ligadas diretamente à guerra, ao belicismo, ao militarismo, por detrás de um discurso “amoroso”, compassivo, como, aliás, acontece em relação à figura de Jesus – em nome do qual já se matou tanta gente neste planeta em cruzadas sanguinolentas –, figura mítica, o Cristo, com a qual Ashtar se “mistura” e até confunde-se...)

Enfim, tudo aí parece remeter a estruturações religioso-messiânicas. E, em específico, remetem a tantas outras proto-seitas ufologistas mais ou menos apocalípticas, caso da recentemente implodida mobilização em torno da figura ficcional (todas as indicações levam a isso) chamada Jan Val Ellan – que, acho eu, não por acaso rima com Ashtar Sheran.

Abraços!

Iuri

2 de fev. de 2010

Tapejara: autocrítica, bom humor e o mundo real do peão gaúcho


Observando algumas comunidades no orkut, que “tiram” o Tapejara – personagem do desenhista e escritor (quadrinista) Paulo Louzada – para “defensor” do gauchismo, entendido como uma autoglorificação, uma autoconsideração superlativa, como se fossemos nós, gaúchos, “o sal da terra”.

Pois eu acho que “o último guasca” é exatamente isso: um guasca (mas não o último), ou seja, o homem rude, que vive nos interiores ou beiradas de cidades, afastado dos refinamentos citadinos, tendo contados esporádicos ou indiretos com o cotidiano “civilizado” da “boa sociedade”. O dia-a-dia do Tapejara é com os animais, as pessoas e o ambiente de uma pequena comunidade no fundo de algum rincão (ou vila de arrabalde e até mesmo na periferia empobrecida de grandes centros urbanos).

Assim, Tapejara se cria, se forma, se educa e socializa em uma “outra lógica”, que, ao se chocar com a “normalidade”, nos faz rir da sua “grossura” e “exotismo” – um xucro, enfim.

Mesmo inspirado em elementos da estátua O Laçador, não é um “modelo de gaúcho”, desses estereotipado pelo MTG – certinho, limpo, com o lenço combinando com a bombacha, que vive em apartamento nas cidades e vai de carro para ensaios de dança e lê manuais que normatizam o comportamento “tradicionalista” (acs!). Não. Ele é desengonçado e parece um palerma, fanfarrão e sentimental. Eu disse “parece”, ou “aparenta”, porque, na verdade, estamos rindo é de alguém que colide com as posturas tidas como “corretas”, “altaneiras”, “civilizadas”.


E nisso , além da gargalhada, surge a nossa simpatia pelo “animal” – justamente porque ele não é o “centauro dos pampas”; não é “um certo capitão Rodrigo”; não é, muito menos, algum gaúcho de programa dominical de TV. Não tem refinamentos intelectuais, acadêmicos, literários; nem um saudosismo piegas de algo que, a rigor, é ficcional, fantasioso, jamais existente; é romanceado como a índia Iracema de José de Alencar. Tapejara VIVE na terra e, embora a comédia, é um gaúcho REAL, de hoje.

A genial criação de Louzada é um “índio” pobre, fora de modismos, desconhecedor de “regras de etiqueta”; possui apenas o seu rancho, seus amigos humildes e sua égua amada (em toda a extensão do termo!); sua instrução é mínima e suas necessidades, preocupações e desejos, básicos. Mas não é um “mal-educado” ou um turrão. É, na verdade, cheio de sensibilidades, fugindo ao machistismo gauchesco, tão insistentemente reivindicado, que virou o seu contrário no anedotário nacional – o gaúcho só pode ser um “boióla” por de traz de tanta necessidade de afirmação de sua masculinidade.

Tapejara é bagual, mesmo! Louzada não lhe dá polimentos de CTG. Mostra características do cotidiano e cultura pampianas a partir dos homens e das mulheres simples, sem posses, que sobrevivem em cantos marginais do RS – e também pela Argentina, Uruguai e Paraguai. Aliás, Tapejara – “Senhor do Caminho” em tupi-guarani – tem tudo a ver com O Banheiro do Papa, belo filme que fala da vida de gaúchos uruguaios, vivendo nos arrabaldes da cidade de Mello, próximo a Aceguá, no Brasil (fica a dica).


Nas tiras, faz-se troça da própria galhardia e coragem “gaúchas”. Exagerada por uma história mitologizada, reproduzida acriticamente, Tapejara, ao contrário, mostra a humanidade do gaúcho; o ser humano falho e risível; o perfeito idiota que todos podemos ser muitas vezes; mostra-nos que, mesmo em nossas limitações de “cultura”, podemos ter as maiores nobrezas; mesmo considerando singularidades, somos, como gaúchos, gente comuns, e não super homens.

Para terminara a conversa, Louzada, por suas historietas, presta um grande serviço, ao mesmo tempo fazendo piada e, paradoxalmente, pela comédia ficcional e até nonsense, apresentando características socioculturais de um gaúcho mais factual.

Diz-se que saber rir de si mesmo é uma virtude positiva. Não um rir de façanhas e ganhos para se gabar, mas um rir das nossas limitações e falhas que nos fazem todos humanos, irmanados por esta condição de seres precários.