Em 18 de março de 1976 o pianista brasileiro Francisco Tenório, em turnê junto com Vinícius e Toquinho em Buenos Aires, “caminhava solitário quando foi jogado para dentro de uma Ford Falcon na esquina da Av. Corriente com a Rua Rodrígues Peña”, centro da capital argentina, conforme reportagem saída em ZH de sexta-feira passada, 13 de abril. Nunca mais foi localizado. A família até já recebeu a indenização do governo argentino pelo desaparecimento do músico, mas nada de seu corpo, perdido em algum cemitério clandestino ou fundo de rio ou mar. Tinha, então, 35 anos.
Francisco Tenório, o Tenorinho, não era militante político, nem envolvido em algum movimento de contestação, mas foi levado por quatro homens mal-encarados, e se sabe que ficou trancafiado na Escola de Mecânica da Marinha (Esma) da Argentina. Não passou de um engano:
“Foi sequestrado por ostentar cabelo comprido e barba, um protótipo de esquerdista”, diz a reportagem... Imagine-se o interrogatório... o cara sempre negando, e aumentando as pancadas, os choques, o sufocamentos... A ação bárbara já fazia parte da união de governos e facções de direita dos países do Cone Sul, perseguindo militantes ou simpatizantes "comunistas". Ou que assim parecesse, caso do jovem pianista - mas já pai de família - Tenorinho.
Alguns sentem saudades da ditadura. Nostálgicos, filtrando só o melhor de um tempo, esquecem que até os pacatos ou alienados ou até empolgados pelo regime podiam acabar numa fria – numa câmara fria, talvez, além de um calvário de humilhações, torturas e, ao final, a morte cruel – tudo em nome da “ordem”, de “Deus”, da “liberdade”, da “pátria”, ou seja, do reacionarismo e moralismo carola recheado de burrice e hipocrisia – e mais uma bom bocado de grana da CIA e vantagens do mando, ou seja, ladroagens variadas, desde tráfico de influência (um emprego para o sobrinho num banco estatal ou para a amante numa repartição pública qualquer), até milhões em contas particulares em paraísos fiscais. Eis os nossos intrépidos militares sul-americanos e seus aliados vinculados a “revolução” de 1º de abril de 1964! Pena que o golpe não foi uma mentira total...
Saindo das barbaridades de militares e polícia no tempo das ditaduras, dá para se perguntar: quantas e quantas vezes somos enganados pelos estereótipos, as imagens padronizadas. Roupas, cabelos, perfumes e palavreados podem nos criar simpatia ou repulsa, respeito ou desprezo conforme os nossos “modelos” internalizados. Não raro o assaltante de joalheria chega “bem vestido” e com “educação”, sendo recebido com sorriso num primeiro momento. Já o maltrapilho e de fala desarticulada é barrado pelo vigilante na porta, mesmo que esteja indo lá para comprar um óculos para a falsas... Falsas expectativas...
Nossos julgamentos precisam ir além da aparência imediata, ou seja, nos despirmos de vários preconceitos.
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