Aproveitando o “aníver” do meu município neste 2012, volto a uma reflexão recorrente:
Hoje comemoram-se 134 anos de Santa Cruz do Sul. A referência é a instalação em 1878 da Câmara de Vereadores, que, na época, fazia o papel de gestora do município, dando assim autonomia à comunidade, que começou como Faxinal do João Faria, originado na sesmaria que precedeu o povoado, constituído originalmente da parentela de João Faria, trabalhadores negros e outros agregados assentados na área, ainda em disputa com grupos indígenas.
O primeiro presidente da Câmara (que poderia ser chamado de prefeito) foi o “nome de rua” Tenente Coronel Brito (José Joaquim de Brito, para ser completo), o que também é um indicador de descendência étnica de famosos da então nascente cidade. E considerando a presença de povos indígenas, de quilombos e da ocupação do território por outros sesmeiros e posseiros luso-descendentes e mestiços de toda a ordem, a “presença germânica” e de outros povos europeus (poloneses, holandeses, belgas, italianos, portugueses etc.), a partir de 1849, aconteceu bastante depois da fundação do núcleo que deu origem a Santa Cruz, demosntrando a variedade de referências étnicas e geográficas a comporem a história e sociedade santa-cruzenses (até coloônia de ceraenses tivemos por aqui).
Interessante notar que o 28 de setembro não é um feriado municipal. Ao contrário de quase todos os municípios, que fazem seus feriados locais em datas que marcam uma emancipação administrativa, o feriado municipal em Santa Cruz é em 25 de julho, data que rememora o assentamento de colonos em São Leopoldo em 1824, e que se tornou data simbólica da teuto-descendência no Rio Grande do Sul. Ou seja, temos aí, na “opção” do “25 de julho” ao “28 de setembro” como simbolismo máximo (dado pelo feriado), mais um elemento que quer reforçar um exclusivismo étnico na conformação do município, “podando” absurdamente a sua origem bem mais longa (anterior aos primeiros imigrantes assentados no loteamento rural estatal em Linha Santa Cruz), diversa e complexa.
Por que disso? Por que da invisibilização ou subalternização de outras referências étnicas? Por que se ressaltar de forma acachapante uma só descendência? Por que seriam “melhores do que outros”? Por que trabalharam mais? Ou o quê?
E qual o resultado desse exclusivismo? Como se sente, por exemplo, crianças que cantam um hino que não fala nada de seus antepassados afros, indígenas, lusos etc (somente da "bravura alemã" do "loiro imigrante")? Que tipo de integração comunitária isso produz? Não há aí espaço para um sentimento de despertencimento, de que todos que não são (ou pareçam) “alemães” são estrangeiros, justamente aqueles que alguns chamam até hoje de “brasileiros” em oposição aos “alemães” (essa denominação tão simplista)? )? Somos, então, um "município alemão", anexo ao Brasil, como desejava o pangermanismo adotado pelo governo Hitler da Alemanha, e que muitos defenderam ardorosamente por aqui? Óbvio que isso é uma bobagem, mas que ainda parece ter ecos.
Que o 28 de setembro – sem feriado – sirva para ir mais longe na história do município e do processo de monopólio étnico já tão naturalizado em Santa Cruz!
*Sobre os povos nativos, são inúmeros os sítios arqueológicos comprovando a ocupação indígena no Vale do Rio Pardo desde muito antes do apossamento da região por parte de portugueses e espanhóis. Os espanhóis, por exemplo, através de missionários, fundaram reduções jesuíticas já nos anos de 1630 por aqui, uma delas no entroncamento do Rio Pardinho com o Rio Pardo, e que foi extinta na ação do bando de preadores de escravos indígenas por parte do famigerado (antigamente "herói" paulista) bandeirante Raposo Tavares.
Smith / Kotzen – “White Noise”
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