29 de jun. de 2009

Em que consiste exatamente a “realidade”?



Estou terminando de ler um livro – Perspectivas sociológicas – de um sociólogo americano chamado Peter Berger. A edição original em inglês saiu em 1963. A editora Vozes botou uma tradução no Brasil, que já está na 18ª edição. Isso para dizer que o livro já é quarentão e foi muito demandado.

Escrito como uma espécie de introdução geral à matéria, não caiu na estrutura indigesta de manuaisões “didáticos” que conheci no tempo da Puc e Ufrgs. Berger é um erudito, conhece em detalhes a sociologia, em especial a americana (ele foi professor na famosa New School for Social Research) e o mundo do seu tempo. Mas escreve sem pedantismo (embora não abrindo mão de uma certa sofisticação na linguagem), sem querer parecer um gênio, com um humor crítico, irônico, mordaz, muito estimulante. É um livro sério sem perder a graça! Pretende ir além de securas sociológicas e hipercientificismo mecânico, penetrando em campos, digamos assim, mais férteis a uma compreensão/cosmovisão/ação humana libertária.

No prefácio ele diz assim (na primeira linha!): “Este livro foi escrito para ser lido, e não para ser estudado.” Noooooosa!!!

Selecionei umas partes que queria mandar pra vocês. Tem a ver com os debates aqui sobre submissão e transcendência dos humanos em sociedade, ou seja, até que ponto conseguimos nos libertar dos “papéis” que desempenhamos no “teatro” que fomos introduzidos paulatinamente, desde a barriga de nossas mães...

Não sei se vou ter paciência para digitá-las todas. E nem sei se alguém aqui da lista tem de fato algum interesse e saco para lê-las!!! Enfim...

Vou pelo menos mandar um trecho, que está mais para o final do livro, num capítulo que tem o subtítulo indicador “A sociedade como drama”. Berger, a esta altura, começa a “puxar da manga” caras como o filósofo francês Sartre e o escritor russo Tolstoi. Vai aí:

Suponhamos um homem que desperte de noite, de um desses pesadelos em que se perde todo o senso de identidade e localização. Mesmo no momento de despertar, a realidade do próprio ser e do próprio mundo parece uma fantasmagoria onírica que poderia desaparecer ou metamorfosear-se em um piscar de olho. A pessoa jaz na cama numa espécie de paralisia metafísica, tendo consciência de si, mas um passo além daquele aniquilamento que avultara sobre ela no pesadelo recém-findo. Durante alguns momentos de consciência dolorosamente clara, pode quase sentir o cheiro da lenta aproximação da morte e, com ela, o nada. E então estende a mão para pegar um cigarro e, como se diz, “volta-se à realidade”. A pessoa se lembra de seu nome, endereço e ocupação, bem como dos planos para o dia seguinte. Caminha pela casa, cheia de provas do passado e da presente identidade. Escuta os ruídos da cidade. Talvez desperte a mulher e as crianças, reconfortando-se com seus irritados protestos. Logo acha graça da tolice, vai à geladeira ou ao barzinho da sala, e volta a dormir resolvido a sonhar com a próxima promoção.

Até aí, muito bem. Entretanto, em que consiste exatamente a “realidade” a que o homem acabou de voltar? É a “realidade” do seu mundo socialmente construído, aquele “mundo aprovado” em que as perguntas metafísicas são sempre risíveis, a menos que tenham sido capturadas e castradas em ritualismo religioso aceito sem discussão. A verdade é que esta “realidade” é, com efeito, muito precária. Nomes, endereços, ocupações e mulheres desaparecem. Todos os planos terminam em extinção. Todas as casas por fim se esvaziam. E mesmo que vivermos todas nossas vidas sem termos de enfrentar a torturante contingência de tudo quanto somos e fazemos, por fim temos de voltar àquele momento de pesadelo em que nos sentimos despojados de todos os nomes e de todas as identidades. Ademais, sabemos disso – o que nos conduz à inautenticidade de correr em busca de abrigo. A sociedade nos oferece nomes para nos proteger do nada.

Constrói um mundo para vivermos e assim nos protege do caos em que estamos ilhados.
Oferece-nos uma linguagem e significados que tornam esse mundo verossímil. E proporciona um coro firme de vozes que confirmam nossa crença e calam nossas dúvidas latentes.

*Escrito em 2005.

**Berger está falando sobre a possibilidade – “a liberdade a que estamos condenados”, conforme as palavras de Sartre – de executarmos ou não certos papéis ou atos socialmente estabelecidos.

***O autor diz que, em contraponto a uma existência humana inautêntica, “Existir autenticamente consiste em viver em plena consciência da natureza singular, insubstituível e incomparável da personalidade”.

20 de jun. de 2009

Árvores, seres inteligentes

Não é a primeira vez que faço comentários sobre a comunicação entre seres de espécies diferentes que habitam a Terra. O assunto ressurgiu quando li uma matéria no caderno Ambiente do jornal Zero Hora, de 28 de maio de 2009. Ali se menciona o quanto poderia ser benéfico o “conversar com as plantas e os animais”. O exemplo disso é o que aconteceu com a médica aposentada, Cândida Otero, 86 anos, que, através do contato íntimo com seres da natureza – e nós humanos somos seres da natureza –, possibilitou-lhe superar a dor de perda de familiares, que a fez chegar nos 34 quilos, tal a depressão em que mergulhou.

Destaque na matéria para a canadense Dorothy Maclean, 88 anos, uma das fundadoras da famosa eco-comunidade Findhorn, no norte da Escócia. Ela lançou no Brasil, no ano passado, o livro O Chamado das Árvores. “Uma legião de seres vivos, compassivos, dotados de inteligência especial”, define ela.

Dorothy é uma ecologista que transcende a “pura” biologia e a política mais dura, entrando no campo da espiritualidade ou religião. Diz que “Somos todos um. Não apenas uma família de seres humanos, mas uma família de seres do planeta. E a vida é essencialmente divina.”

E sobre o contato com esses seres tão antigos, as árvores, que habitam fisicamente o nosso planeta muito antes dos humanos? Será que todos seriam capazes de entender “o chamado”? Como ouvi-las? Na entrevista pra revista Claudia (Editora Abril, novembro de 2008), Dorothy diz que “a conexão vem quando somos amorosos e pacientes e reconhecemos sua inteligência”. A dica é: “Na presença delas, mantenha a mente receptiva, faça uma conexão com Deus – ou com a força de vida que está em todas as coisas. Concentre-se nessa sabedoria, e a comunicação será possível”.

Mas não é de uma hora para outra. Conta que, com ela “isso começou a acontecer depois de uns dez anos de prática meditativa, de sintonia com a minha divindade interior. Não ouço vozes nem tenho visões, é como se fosse uma idéia que me chega inteira, vinda do reino vegetal. Uma espécie de telepatia. Aí, tento traduzir esse insight em palavras fazendo anotações em um caderno de bolso”.

Com todas as espécies de seres – até bem além dos terráqueos – deve ser assim, me parece. Não bastarão antenas, telescópios, sondas para o “contato”. Ficções como os de filmes clássicos, Contatos Imediatos de Terceiro Grau, de Steave Spielberg, por exemplo, também podem ser um reforço a ilusões – de que haveria algo palpável, algum aparato tecnológico, físico, material, enfim, mediado a comunicação entre humanos e... bem... humanóides – que é o “formato” que mais podemos imaginar enquanto ser inteligente (por isso a profusão de greys e assemelhados), tal nosso limitante e limitador antropocentrismo (o ser humano como centro, razão e parâmetro para tudo). Desconfio que será preciso muito mais é um coração compassivo, uma mente livre e uma grande abertura para todas as possibilidades de comunhão com as coisas da Vida, do Universo, do Infinito.


*O chamado das Árvores, 2008, Irdin Editora. Sinopse: “Aprendemos que as árvores não são apenas as guardiãs, mas também a pele da Terra. A natureza não é uma força cega e rude, mas uma presença inteligente, que pode e deseja comunicar-se e cooperar com uma humanidade desperta.” FONTE: http://www.livrariacultura.com.br

**“Na década de 60, a educadora Dorothy Maclean e seus amigos Eillen e Peter Caddy já meditavam e mantinham uma forte conexão com uma espécie de divindade interior. Guiados por ela, os três deixaram seus empregos formais e viajaram a bordo de um trailler até o meio de uma área desértica, no norte da Escócia. O solo era árido, mas eles tinham como missão ficar ali e fazer um jardim. Trouxeram as plantas e se puseram a trabalhar na terra. Em pouco tempo, a área estava coberta de vegetação, flores e frutos. Assim nasceu a comunidade de Findhorn, a ecovila mais antiga do mundo, fundada há quase 50 anos. Hoje, é um centro de estudos de projetos de sustentabilidade e de práticas espirituais, pois, segundo os idealizadores, essas seriam duas faces indissociáveis da manutenção da vida.” FONTE: http://holosgia.blogspot.com/

***Na mesma matéria de Zero Hora, fala-se da veterinária Sheila Waligora, “comunicadora entre espécie”. Ela diz usar técnicas telepáticas. “A fala para eles [cães, gatos e outros animais não-humanos] é apenas um ruído, eles compreendem a nossa intenção.”

No blog da veterinária – : http://sheilawal.wordpress.com/ –, destaquei a seguinte parte do texto “De quem é a Terra?”:

A Terra, verdadeiramente, é dos animais, das plantas, dos minerais [...]…
Nós humanos somos seres visitantes e nossa passagem por aqui é muito breve. Ainda mais por isso, nosso respeito pela natureza e seus seres precisa ser imenso, assim como nossa gratidão por podermos compartilhar de tanta beleza.

Neste contexto e com essa visão, pensamos em propor às pessoas, que experimentem se comunicar com uma flor, com um inseto, com uma linda árvore e com os animais.

Vestidos com amor e respeito, com reverência, cumprimentamos os seres da natureza e nos colocamos ali, com o coração e os ouvidos muito abertos, para receber aquilo que eles querem nos transmitir. Ao silenciarmos, com essa atitude interna, estamos criando o ambiente perfeito, para recebermos uma mensagem que pode transformar nossas vidas.

A comunicação telepática com outras espécies é uma comunicação expandida, quando abrimos ainda mais todos os nossos sentidos, para nos capacitarmos a ouvir mensagens inesperadas, que podem transformar nossa atitude em relação a animais, plantas e à natureza em geral.



Pode transformar também nossa maneira de viver, pois vamos começar a prestar mais atenção aos nossos hábitos, vamos ficar mais conscientes em relação aos nossos pensamentos, vamos cuidar mais dos nossos relacionamentos entre humanos e , quem sabe, vamos até resolver criar um momento diário para silenciar e fazer absolutamente nada?

Da polenta e da cuca – uma pureza que não existe



Dias desses eu li na coluna Almanaque Gaúcho, de Olyr Zavaschi, publicada diariamente (menos domingo) em Zero Hora, um pequeno artigo “A milenária polenta” (p. 54, 23/05/2009). Pois este alimento – tão associado ao imigrante italiano no Rio Grande do Sul – sintetiza múltiplas e antiquíssimas influências – vejam só! – asiáticas, européias e americanas, ou seja, muito além da Itália e das zonas de colonização itálicas em solo gaúcho. Assim, um símbolo distintivo de uma etnia, carrega, na verdade, aquilo que todos somos: seres culturalmente híbridos desde sempre, não havendo existência real de purismos, fechamentos e exclusividades.

Anota Zavaschi que “a palavra como hoje é usada chegou à península Itálica com os hunos. O termo caucásico pulint (que se pronuncia pulent) foi trazido para o Ocidente com as tropas de Átila, no século 4º. Com a descoberta [?] da América e a introdução do e de sua farinha na Europa, a polenta ganhou um ingrediente fundamental. Foi assim, feita de farinha de milho, com herança asiática e ingredientes pré-colombianos, que ela embarcou nos navios da imigração no fim do século 19.”

O colunista finaliza dizendo: “Antes da vinda dos italianos, já se consumia no Brasil um produto assemelhada, o angu, que provavelmente tenha origem na papa de milho, consumida na Ilha da Madeira.”

A mesma coisa com a cuca, por exemplo, bolo típico das regiões e grupos com colonização germânica aqui no Rio Grande do Sul. Muitas influência e história se consubstanciam naquela delícia, com é o caso das coberturas tão tropicais – abacaxi, banana e o coco; ou ameríndias – o amendoim e o chocolate... Nas proprias comunidades massivamente formadas por descendentes de imigrantes da região que hoje é a Alemanha, come-se a cuca acompanhado de uma beberagem do povo guarani, o chimarrão, feito da nativa Ilex Paraguariense, a erva-mate.

11 de jun. de 2009

O golpe fatal – sobre a morte de David Carradine, de Kung Fu e Kill Bill

O famoso ator David Carradine, que interpretou o desgarrado monge Shaolin no não menos famoso seriado televisivo Kung Fu – exibido originalmente a partir de 1972 pela rede ABC dos EUA – foi encontrado morto no quarto de um hotel na Tailândia no último dia 4 de junho (2009). Tinha 73 (alguns falam em 72) anos e tudo indica que ele não se matou, embora tenha sido encontrado com improvisadas cordas no pescoço, dependurado dentro do guarda-roupa do seu quarto em Bangcoc, onde participava de filmagens.

O que ele estava fazendo daquele jeito? Ora, nada menos que praticando uma técnica da velha punheta, que recebe o "nome técnico de "hipóxia auto-erótica"*. Ou seja, Carradine masturbava-se quando lhe abateu um “piripaque” devido à auto-asfixia. O coração do também intérprete do chefão dos filmes Kill Bill I e II parou, interrompeu seu vai e vem, e o septuagenário escafedeu-se de maneira irrecuperável... Bizarro. Talvez nem Tarantino pudesse imaginar um desfecho assim patético...

Sabe-se que a asfixia pode produzir uma ereção vigorosa. Combinada com todo o composto emocional do limiar da morte (ou da vida), situação tão ligada à libdinosidade (“Freud explica!”), estamos diante de uma poderosa “auto-gratificação” sexual.

Carradine poderia ter mulheres quase à vontade. Grana não lhe faltava. Estava hospedado nababescamente. Mas optou pela masturbação! Eis um grande mistério... Talvez até em acordo com seu personagem “Gafanhoto”, andarilho fugido da China (Tailândia também é no Oriente...), naquela mistura melancólica e enigmática de western (ou bang bang) e filme de artes-marciais. Aos 73 anos, homem de sucesso, recuperado do alcoolismo, rodeado de belas moças, David apela para "la palmita de la mano", o “cinco-contra-um”, “descabelar o palhaço”, “descascar a banana”...

O que há em nós para esta busca de regozijo erótico auto-suficiente? O onanismo** parece uma religião pagã bastante popular pela vida e mundo afora. De alguma maneira, estabelece um “religação” conosco mesmo e nos proporciona momentos epifânicos...

Enfim... O monge solitário de Kung Fu acabou manifestando-se de uma forma inusitada na morte de Carradine, seu intérprete agora eterno. O ator morreu buscando solitariamente, numa íntima e, no caso, perigosa arte, sua redenção – nem que seja por segundos –, de alguma forma mimetizando o personagem Kwai Chang Caine...

(Mas vamos esperar as perícias e investigações para sabermos mesmo o que aconteceu.)

* Rogério Bernardo, urologista, em seu blog - http://papocomrogerio.blogspot.com -, diz que "Hipóxia Erótica ou Hipóxia auto-erótica, [é o] ato de provocar privação de oxigênio com aumento da concentração de dióxido de carbono da circulação sanguínea, o que provocaria uma maior excitação e um acréscimo do prazer. / Alguns autores atribuem ao efeito alucinógeno do aumento do aumento de monóxido de carbono. Outros defendem que a elevação das catecolaminas, entre elas a adrenalina seria a responsável pelo prazer provocado pela hipóxia erótica. / Para se ter uma idéia da quantidade de pessoas que já faleceram desse mal, cerca de 500 a 1.000 nos EUA, faleceram em apenas um ano decorrente de hipóxia erótica. / As técnicas de privação de oxigênio são várias: cinto, corda, retalhos de panos, sacos plásticos, etc. Outro dado é que o acometimento é quase sempre masculino, e geralmente acessórios sexuais ou roupas femininas são encontrados próximos às vítimas. Em alguns casos, as vítimas foram encontradas vestidas em roupas femininas e até com perucas. / Os praticantes da hipóxia erótica vivem em uma tênue linha entre o prazer exacerbado e a morte. É que a alucinação provocada pelo aumento do dióxido de carbono pode levar a uma perda de consciência e o indivíduo não consegue desfazer a constricção cervical, ou seja, ocorre o enforcamento até a morte. / Estamos longe de entender o que aflora no universo da sexualidade humana".

** Moacyr Scliar lançou recentemente (junho de 2009) mais uma obra, abordando um tema que entrou em questão aqui, a "paixão solitária" - e o livro se chama justamente de Manual da Paixão Solitária (Companhia das Letras, 2009). Conhecedor e apreciador da bíblia e tradições da cultura e história hebraicas, fala do onanismo, termo derivando de um personagem bíblico. Conforme a reportagem Em busca do prazer solitário, de Chico Caldeira (EpNews), publicada na Gazeta do Sul (Santa Cruz do Sul) o livro "trata da trajetória do patriarca Judá, de seus filhos Er, Onan [olha aí o nome do cara!] e Shelá e de suas conturbadas relações com a linda Tamar. [... Mas] o verdadeiro teórico e defensor do sexo solitário foi Shelá [Onam só levou a fama...], o irmão caçula que, impedido pelo pai de desposar a fogosa Tamar, busca consolo com as mãos numa caverna escura e usa a imaginação para transformar a masturbação em um sofisticado ritual [- e nisso Carradine se deu mal da última vez...]. Segundo Shelá, masturbar-se é uma espécie de transfiguração, um momento culminante da existência humana [- no caso do ator, culminou na radicalidade da morte...].

Scliar diz que "o texto bíblico também deve ser lido da mesma forma que os livros de autores clássicos. 'Como um livro de Shakespeare ou Cervantes, os jogos de poder e as intrigas amorosas comuns a nossa natureza estão nessa obra. A Bíblia é um verdadeiro catálogo das paixões humana.'"

Acerca de um texto - comentário


Li rápido e achei que há coisas legais ali, caro Marcelo. Mas este termo "O Criador", em (talvez) substituição a "O Deus", cai em duas situações em que meus preconceitos formigam deveras: (I) trata-se de uma expressão masculina (por que o autor não usa "A Criadora"???) e (II) insere-se numa visão que existe UM ser ou força criadora tão somente... Por que isso, tchê? Que coisa é essa de UNIDADE? Por que não pode ser algo poli/maxi/hiper/mega/difuso? Sei que a Cabala tem a ver com o esoterismo israelita; talvez venha daí esses dois elementos cretinos da nossa "cultura ocidental", que posso fundir na expressão "machismo monoteísta" - O Todo Grande Falo Dominador que criou o céu e a terra. Sei que, como estratégia mental, fazer aquelas elucubrações, a fim de absorver negativismos e ficar-se tranquilito com o nosso futuro e passado, nisto as propostas do texto podem ser boas. Mas eu não quero engolir qualquer argumentação/discursso/profissão de fé etc. que não seja transmutada pelo meu próprio ser ideologicamente cambaleante, duvidoso e frágil, mas sedento de epifanias. Hoje, talvez, a linha que me parece mais interessante para se compreender e vivenciar o mundo é algo próximo ao zen budismo (nada de budismo tibetano, com seu ritualismo, panteão e hierarquia tão carnavalesca e opressiva quanto a comandada pelo Bento 16), onde não há deidades a se cultuar, tão somente uma atitude de contemplação, paciência, compaixão e absorção transracional de tudo que nos cerca.

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O texto em referência é o seguinte (reproduzo só os 3 parágrafos iniciais):

A Atitude – O trabalho espiritual

por Michael R. Kellogg

Todos os dias, passamos por dezenas ou centenas de situações com as quais podemos não concordar de uma maneira ou outra. Nós podemos acordar ao lado de um cônjuge resmungão, ter ao lado uma pessoa que nos incomoda durante a viajem diária ao trabalho, problemas com o chefe ou com um projeto; a lista é interminável.

No entanto, a grande maioria destas experiências negativas quase nem nos afeta e nem sequer perdemos um segundo do nosso pensamento com elas. Quase nem se nota o menor dos acontecimentos. Se nos sentimos incômodos na cadeira ou nos afogamos com um copo de água, fazemos uma careta, nos acomodamos e continuamos com as nossas atividades.

Porém, cada um desses acontecimentos negativos nos dá uma oportunidade para preparar o trabalho espiritual. É assim porque a espiritualidade tem tudo a ver com a nossa atitude em relação ao Criador. Nos disseram que há dois fatos fundamentais. Em primeiro lugar, “Não existe ninguém mais além Dele”, o que significa que não existe nenhuma outra força no mundo que não seja o Criador, e Ele é a força motriz que está atrás de cada ato. (...)