22 de mar. de 2011

Nossa animalidade (sobre o sacrifício de animais em rituais religiosos)


Estima-se que cerca de 50 mil pessoas eram sacrificadas (poderia-se dizer, também, assassinadas barbaramente) pelos Astecas no México até o domínio espanhol arrasar com esse império indígena na América Central no início do século XVI. Incluía-se na contabilidade macabra, jovens donzelas e crianças pequenas – justificando-se suas mortes por conta das lágrimas e dores, que seriam mais puras e, assim, de maior agrado a certas divindades...

Toda esta matança ritual, onde se arrancava o coração da pessoa ainda viva – sustentada por guerras com povos vizinhos e outras querelas, abastecendo o insaciável patíbulo – é perfeitamente compreensível dentro da organização social e religiosa asteca, mas, obviamente, visto com ojeriza por quem não compartilhava daquelas crenças. Até os europeus – embora toda a carnificina implicadas no domínio das terras e riquezas arrancadas das Américas – se escandalizavam com a sangueira. (Obs.: Sangueira essa superada nos rituais cristão pelo canibalismo e vampirismo metafóricos, contidos no ato de comer o corpo e beber o sangue de Jesus na forma da hóstia e do vinho consagrados; Cristo teria sido o último humano a ser sacrificado pela salvação do mundo, poupando outras vidas humanas.)


Vindo para os nossos dias, podemos dizer que algo semelhante aos “sacrifícios” astecas acontece com os animais não-humanos em diversos cultos religiosos ainda praticados pelo mundo. Assim como um grupo humano – caso dos mexicanos pré-colombianos – se arrogava o direito de tirar a vida de uma pessoa de outro grupo ou de outra classe social, assim também se submete à morte os animais não-humanos em nome de crenças supremacistas dentro do reino animal. Nós, mamíferos bípedes com o polegar opositor, nos achamos “o ó do borogodó” do planeta; damos a nós mesmo, em nosso incontido egocentrismo cósmico, o direito de dispor da vida de outros mamíferos, e também de aves, répteis, peixes, para obtermos a boa disposição de divindades. Ou seja, obrigamos outros seres a compartilhar “na marra” – e ao preço de sua dor, desespero, fraqueza e, por fim, extinção –, ideias religiosas particulares ao bicho homem.

Por conta disso, sou favorável a abolição de sacrifícios (alguns chamam eufemisticamente de “sacralização” ao invés de “morte”) de animais por qualquer tipo de ritual. Já acho horripilante a matança para fins de alimentação (por isso procuro seguir uma dieta vegetariana), que dirá para satisfazer crenças pessoais ou de grupos. Podemos transcender isso e encontrar formas de contentar deuses, divindades, potências – ou o que seja – de uma forma menos covarde, menos dolorosa a seres inocentes e alheios às nossas teologias.

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